Nesta época em que quase nada acontece de realmente importante, a mídia continua necessitando preencher seus espaços. Qualquer coisa serve, até pelada de ex-jogadores de futebol.
Leio que o Time do Zico enfrentou os Amigos do Zico, em pleno Maracanã (!). O jogo terminou em 5x5 e o ex-Galinho de Quintino foi o artilheiro, com três gols, apesar dos seus 56 anos bem vividos.
Não dá pra saber se marcou mesmo esses tentos ou deixaram que os marcasse.
Quando Garrincha, acabado e gordo, atravessava terríveis dificuldades financeiras, armaram uma partida em sua homenagem, para prover-lhe uma graninha. Foi em 1973.
O grande Mané, um dos mais desconcertantes craques que o futebol brasileiro já produziu, dava até pena. Tropeçando nas pernas, foi incapaz de fazer o gol que os zagueiros adversários facilitavam até dar na vista.
Os cariocas, que compareceram em massa para se despedir do ídolo, não viram canto do cisne, só melancólica decadência. Mesmo assim aplaudiram sem parar, como bons brasileiros cordiais.
Mas, voltemos ao Zico.
Embora acompanhasse o futebol desde menino, tive poucas oportunidades de escrever sobre meu esporte favorito no batente diário de jornalista.
Uma vez foi às vésperas do Mundial de 1990. Fiz, para revistas de variedades, uma matéria com veteranos de Copas passadas dando seus testemunhos.
O trabalho foi facilitado pela participação de dois dos entrevistados na Seleção de Masters do Luciano do Valle. Então, numa manhã de domingo, consegui falar com o Zico e o Rivelino, que estavam hospedados com a delegação no hotel Transamérica (SP).
O galinho tomava sol à beira da piscina, com seu filho de uns oito anos. Causou-me ótima impressão.
Depois de tanto entrevistar políticos, artistas, personalidades e celebridades, era uma lufada de ar fresco falar com quem não mostrava empenho em me manipular, respondia com sinceridade, não esticava o papo nem me puxava o saco.
[O mais repulsivo entrevistado com quem me deparei foi o sindicalista Antonio Rogério Magri, ainda antes que se tornasse ministro do Trabalho do Collor. Ele fizera um curso de relações públicas nos EUA e o seguia à risca. Assim que me viu, garantiu ter certeza de já nos havermos cruzado antes. Só que eu também tinha certeza... de que nunca o vira mais gordo!]
Faz muito tempo e eu só me lembro do que o Zico me contou sobre a fatídica derrota na disputa em pênaltis com a França, no Mundial anterior.
Depois de haver desperdiçado uma penalidade máxima durante a partida, ele aceitou a responsabilidade de ser um dos cinco brasileiros que decidiriam a vaga. E não negou fogo. "Tive moral para dar a volta por cima e cumprir o meu papel", comentou.
Mas, indaguei, por que a última cobrança ficou para o zagueiro Júlio César (que chutou na trave) e não para um atacante, especialista no ofício?
O Zico confessou que havia um atacante escalado, mas "pipocou na hora H". Dignamente, não quis dar nome aos bois. [Por exclusão, seria o Careca...]
Quanto ao que eu conversei dessa vez com o Rivelino, esqueci completamente. Mas, a ele eu já havia entrevistado antes, para a revista Playmen (projeto fracassado de revista masculina chique feita por editora pobre). E este, sim, foi um trabalho inesquecível.
Era lá por 1980 e ele estava em férias no Brasil, depois de duas temporadas no El Helai, da Arábia Saudita. Conversamos longamente no seu posto de gasolina do Brooklin (SP).
Falou muita coisa sobre a vida naquela país exótico:
Leio que o Time do Zico enfrentou os Amigos do Zico, em pleno Maracanã (!). O jogo terminou em 5x5 e o ex-Galinho de Quintino foi o artilheiro, com três gols, apesar dos seus 56 anos bem vividos.
Não dá pra saber se marcou mesmo esses tentos ou deixaram que os marcasse.
Quando Garrincha, acabado e gordo, atravessava terríveis dificuldades financeiras, armaram uma partida em sua homenagem, para prover-lhe uma graninha. Foi em 1973.
O grande Mané, um dos mais desconcertantes craques que o futebol brasileiro já produziu, dava até pena. Tropeçando nas pernas, foi incapaz de fazer o gol que os zagueiros adversários facilitavam até dar na vista.
Os cariocas, que compareceram em massa para se despedir do ídolo, não viram canto do cisne, só melancólica decadência. Mesmo assim aplaudiram sem parar, como bons brasileiros cordiais.
Mas, voltemos ao Zico.
Embora acompanhasse o futebol desde menino, tive poucas oportunidades de escrever sobre meu esporte favorito no batente diário de jornalista.
Uma vez foi às vésperas do Mundial de 1990. Fiz, para revistas de variedades, uma matéria com veteranos de Copas passadas dando seus testemunhos.
O trabalho foi facilitado pela participação de dois dos entrevistados na Seleção de Masters do Luciano do Valle. Então, numa manhã de domingo, consegui falar com o Zico e o Rivelino, que estavam hospedados com a delegação no hotel Transamérica (SP).
O galinho tomava sol à beira da piscina, com seu filho de uns oito anos. Causou-me ótima impressão.
Depois de tanto entrevistar políticos, artistas, personalidades e celebridades, era uma lufada de ar fresco falar com quem não mostrava empenho em me manipular, respondia com sinceridade, não esticava o papo nem me puxava o saco.
[O mais repulsivo entrevistado com quem me deparei foi o sindicalista Antonio Rogério Magri, ainda antes que se tornasse ministro do Trabalho do Collor. Ele fizera um curso de relações públicas nos EUA e o seguia à risca. Assim que me viu, garantiu ter certeza de já nos havermos cruzado antes. Só que eu também tinha certeza... de que nunca o vira mais gordo!]
Faz muito tempo e eu só me lembro do que o Zico me contou sobre a fatídica derrota na disputa em pênaltis com a França, no Mundial anterior.
Depois de haver desperdiçado uma penalidade máxima durante a partida, ele aceitou a responsabilidade de ser um dos cinco brasileiros que decidiriam a vaga. E não negou fogo. "Tive moral para dar a volta por cima e cumprir o meu papel", comentou.
Mas, indaguei, por que a última cobrança ficou para o zagueiro Júlio César (que chutou na trave) e não para um atacante, especialista no ofício?
O Zico confessou que havia um atacante escalado, mas "pipocou na hora H". Dignamente, não quis dar nome aos bois. [Por exclusão, seria o Careca...]
O PRÍNCIPE E O PLEBEU
Quanto ao que eu conversei dessa vez com o Rivelino, esqueci completamente. Mas, a ele eu já havia entrevistado antes, para a revista Playmen (projeto fracassado de revista masculina chique feita por editora pobre). E este, sim, foi um trabalho inesquecível.
Era lá por 1980 e ele estava em férias no Brasil, depois de duas temporadas no El Helai, da Arábia Saudita. Conversamos longamente no seu posto de gasolina do Brooklin (SP).
Falou muita coisa sobre a vida naquela país exótico:
- que podia deixar o carrão aberto e com a chave no contato, pois ninguém roubava (se o fizesse, teria as mãos decepadas...);
- que não podia receber fitas VHS dos filmes escandalosos da época, mas os assistia... com o próprio príncipe, a quem a restrição, claro, não atingia;
- que era uma vida das mais tediosas e, vez por outra, os jogadores brasileiros armavam uma feijoada para espairecer, com caipirinha e tudo (mas, ai deles se consumissem álcool em público!).
Dito e feito. Duas semanas depois, recusou-se a cumprir até o fim seu contrato.
O príncipe, altaneiro e rancoroso, não exigiu compensação financeira nem aceitou propostas de clubes brasileiros por seu passe. Decretou apenas que o Rivelino, então com 35 anos, nunca mais jogaria futebol profissionalmente.
Vai daí que só lhe acabaria restando, como tardio prêmio de consolação, a trupe do Luciano do Valle.
A MAIOR LIÇÃO DO DOUTOR
Quanto ao jogador que eu mais gostaria de haver entrevistado, nunca rolou: o Sócrates.Tão inteligente quanto ele nos gramados, só mesmo o Johan Cruyff holandês. E eu tenho especial admiração pelos maestros que ditam o ritmo e pensam pela equipe inteira.
Além dos três títulos estaduais a que conduziu o Corinthians (em 1983, principalmente, carregou o time nas costas) e da autoria de algumas das jogadas mais belas que vi na vida, deve-se ao Sócrates a incrível iniciativa de unir o grupo para a tomada de decisões que afetavam seus interesses, contrapondo-se à obtusidade dos cartolas. A democracia corinthiana foi uma experiência belíssima.
E, nesse esporte tão distorcido pela ganância extremada que passou a imperar nas últimas décadas, até um Adriano merece ser aclamado por trocar o vil metal pela satisfação de morar no Rio de Janeiro, fevereiro e março, que continua lindo e tem um povo caloroso como nenhum.
Maior ainda foi Sócrates, que se comprometeu publicamente (meninos, eu vi!), diante de um milhão de manifestantes das diretas-já, no Vale do Anhangabaú: "Se a Emenda Dante de Oliveira for aprovada, eu recusarei a proposta da Fiorentina. Ficarei para dar minha contribuição pessoal à redemocratização do Brasil!".
Nem de longe um magnata futebolístico, ele estava disposto a abrir mão de uma grana imensa em nome de suas convicções.
Mas, parlamentares canalhas ficaram insensíveis à vontade do povo.
texto: Celso Lungaretti
postado em Náufrago da Utopia
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